Hidrelétrica de Belo Monte e outros temas do governo petista opõem teólogos da libertação

Desde muito cedo o governo do PT dividiu não só a sociedade
brasileira em pobres e ricos, povo e elite, nós e eles etc., mas dividiu a
própria esquerda universitária e partidária e também os adeptos e militantes da
Teologia da Libertação.
Enquanto alguns desses teólogos assumiram alegremente a
defesa e assessoria do governo de Lula como foi o caso de Leonardo Boff, outros
entraram de corpo e alma para administração como o caso do Frei Betto que
assumiu o comando do Programa Fome Zero; outros preferiram um apoio discreto
como no caso de Clodovis Boff outros ainda passaram a criticar o caráter
assistencialista e não emancipador dos programas sociais do novo governo como
foi o caso de Rosalvo Salgueiro.
Inicialmente estes embates ficavam restritos aos ambientes
das faculdades de teologias, das comunidades das religiosas e populares em que militavam, porém
aos poucos as divergências foram se manifestando e hoje há um confronto aberto,
para não dizer conflito, entre estes nomes que em verdade acabam representando subcorrentes
dentro dessa escola teológica.
Clodovis Boff que é irmão de sangue de Leonardo Boff e padre
da Ordem dos Servos de Maria fez uma releitura dos postulados da Teologia da
Libertação e foi duramente criticado pelos colegas e hoje é tido, por muitos, como
um prófuga dessa corrente teológica, muito embora muitos outros ainda continuem
defendendo sua contribuição.
Para entender estes posicionamentos é bastante ilustrativo o embate que ocorreu na página oficial do Leonardo
Boff nos tempos áureos de popularidade do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
Leonardo Boff havia escrito um artigo criticando a
construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e se solidarizando com o Bispo
Erwin Krältler, ao que Rosalvo Salgueiro questionou.
Veja o diálogo:
04/04/2012 21:11
Meu caro Leonardo Boff, penso que
quem defendeu o governo Lula e agora defende e serve ao governo Dilma, é
corresponsável nestas agressões. Pra merecer credibilidade, a coerência e o
testemunho são indispensáveis!
Rosalvo
Leonardo Boff:
05/04/2012 8:44
Rosalvo,
VC de que lado está finalmente?
Tem saudades das classes dominantes? A Dilma tem a aprovação de 77% dos
brasileiros. Isso deveria faze-lo pensar ou julga que o povo é ignorante e nada
sabe? Nunca servi a governo e a partido nenhum. O que não me impede de exercer
minha cidadania e apoiar um projeto político que significa a ruptura histórica
da politica feita pelas elites e para as elites e nunca para o povo. Agora que
existem politicas republicanas, cuja centralidade está no social e na inclusão
dos 40 milhões que estavam à margem, devemos saudá-las. Desvios e desmandos não
podem simplesmente serem tributados à Presidenta. Nunca em governo nenhum a
Policia e as investigações foram tão incentivadas a partir do poder oficial.
Espero que não negue estes
avanços. Mas a liberdade pertence a cada cidadão
Lboff
Rosalvo Salgueiro:
17/04/2012 21:10
Caro irmão Leonardo Boff,
Com todo respeito!
Não cultivo a visão dicotômica, seja
da natureza, da realidade como um todo ou simplesmente da política. Sei, e até
posso concordar, que o fragor da realidade às vezes impõe-nos escolhas que se
não estão absolutamente concordes com o que pensamos, são as possíveis e
viáveis no momento. Sei também que o exercício do poder, principalmente na
escala da Presidência da República, implica em conviver com as contradições.
Até aqui, nada a estranhar!
Não tenho saudade da classe
dominante, pela simples razão de que saudade se tem de algo ausente, o que não
é o nosso caso. A classe dominante continua, como dantes, a exercer o poder em
toda sua inteireza em nosso País. Os lucros dos bancos, os “eikes batistas” da
vida e o coronelismo nordestino, de roupagem nova é bem verdade, bem o
demonstram sem deixar lugar para dúvidas.
Realmente, prezado irmão, vemos e
avaliamos o governo de turno de maneiras bem diferentes. Você me pergunta de
que lado estou, e eu repondo de modo muito simples:
1- Hidrelétrica de Belo Monte: Estou do lado dos indígenas, dos ribeirinhos,
dos animais da floresta, dos peixes e das águas do Rio Xingu. Estou do lado do
Bispo Erwin Kräutler e da participação verdadeiramente democrática dos
atingidos nas decisões que lhe dizem respeito.
2- Transposição das águas do Rio São Francisco: Estou do lado dos
que lutam para que o rio seja primeiro revitalizado para só então contribuir
com outras regiões, atendendo principalmente a todos quantos vivam às margens
dos tais “canais”. Estou do lado do Bispo Dom Frei Flavio Cappio que, neste
momento, encarna e representa o povo pobre e espoliado da região.
3- Necessidade de energia para o desenvolvimento: Estou do lado das
tecnologias alternativas, das pequenas hidrelétricas de menor impacto, da
energia eólica, da energia de biomassa, da energia solar, etc. Estou do lado
que você propôs: de que repensarmos nossa relação com a natureza e a noção de
desenvolvimento e consumo.
4- A Mãe do PAC: Estou do lado da decência e da transparência,
defendo auditoria independente, CPIs e outros mecanismos de apuração e
responsabilização, se possível com cadeia para os culpados. (Corrupção mata!)
5- Os 77% de aprovação da Dilma: Estou entre os outros 23% e não me
enganam estes números que em si mesmos não dizem nada: Hitler, Mussolini,
Herohito e muitos outros ditadores alcançaram índices ainda maiores de
aprovação popular!
Leonardo desculpe-me por
meter-me, justo aqui a, a discutir contigo estas coisas, mas é que ainda não
sei como nestes temas, alguém pode sentir-se ao mesmo tempo apoiando os dois
lados em conflito. Em Belo Monte , assim como em todas as hidrelétricas em execução
ou em projeto na bacia Amazônica, no Rio São Francisco, na defesa do Meio
Ambiente e da Ecologia, e em muitos outros temas estou convencido que não há
como ser as duas coisas ao mesmo tempo. Prometo não continuar incomodando lhe
aqui, mas humildemente devolvo-lhe a pergunta.
De que lado você está?
Sobre os teólogos:
Leonardo Boff é o principal nome da Teologia da Libertação,
é doutor em filosofia e teologia pela Universidade de Munique, Alemanha.
Rosalvo Salgueiro, também é reconhecido como um nome
importante da Teologia da Libertação. Além de filósofo e teólogo é também
mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada, Espanha.
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