Grupo ligado ao PSDB
acusa o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) de usar ligações com PT
para furar a fila do Minha Casa, Minha Vida
O Movimento dos Trabalhadores Sem-teto (MTST) não é um
movimento social que faz pressão somente por habitação. É um movimento
político, que luta pelo socialismo e que, embora critique a atual política
econômica do governo federal, está engajado na defesa do mandato de Dilma
Rousseff por considerá-la ameaçada pelo pedido de impeachment em discussão no
Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF).
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Guilherme Boulos e integrantes do MTST com a presidente Dilma e o Prefeito Haddad |
A avaliação, feita na semana passada pelo principal líder
nacional do MTST, Guilherme Boulos, minutos antes da maior manifestação do ano
a favor de Dilma, na Avenida Paulista, no centro de São Paulo, deixa clara a
posição do movimento que batalha pela manutenção e ampliação do acesso às
verbas do Minha Casa Minha Vida (MCMV) Entidades, principal fonte de renda para
garantir a militância do movimento.
Com novas áreas à espera de recursos do MCMV, como Novo
Pinheirinho (Santo André), Dona Deda (Campo Limpo), Nova Palestina (zona sul),
o MTST já conta com terreno da Copa do Povo, em Itaquera, comprado da Viver
Incorporadora, que tem prevista a construção de 2.650 unidades. O dinheiro,
segundo o Ministério das Cidades, já está destinado à Associação de Moradores
do Acampamento Esperança de Um Novo Milênio, do MTST. A bagatela de R$ 201,4
milhões pode chegar até R$ 307,4 milhões com o acréscimo, por unidade, de R$ 20
mil do programa estadual Casa Paulista, e mais R$ 20 mil do programa municipal
Casa Paulistana, da Prefeitura.
“Mas isso ainda é só plano. Não existe esse dinheiro”, diz
Boulos, explicando que o único empreendimento concluído e entregue do MTST é o
Condomínio João Cândido, no Taboão. Ali, o aposentado José Ferreira da Silva,
de 67 anos, mora em um apartamento com a mulher, Maria Costa Gomes, de 70 anos,
em um apartamento de 63 m², assoalho de azulejos brancos, portas adaptadas para
eventuais necessidades especiais, com três dormitórios, sala, cozinha, área de
serviço, sacadinha em prédio com elevador.
Um cálculo feito na Secretaria Estadual da Habitação, em
planilhas de 2012 e 2015, mostra que o MTST já recebeu R$ 81,3 milhões pelo
MCMV Entidades no estado de São Paulo. “O MTST não recebe um centavo porque o
dinheiro é repassado direto para o dono do terreno”, rebate Boulos.
Segundo a secretaria, há uma lista de 29 entidades com
recursos para habitação, totalizando R$ 307,7 milhões. E o MTST, sozinho,
segundo os dados, detém um quarto dos recursos para construção de 3.944
unidades. “Além do João Cândido, o único recurso liberado foi o do Copa do
Povo, comprado por R$ 28 milhões”, afirma Boulos.
O Copa do Povo foi ocupado pelo MTST em maio de 2014. Era
uma zona de produção industrial (ZPI), que proibia a construção de residências.
Uma lei municipal teve de ser criada para que a área pudesse entrar no programa
de habitação. “Curiosamente, foi o vereador Police Neto (PSD), que teve até
boneco queimado pelo MTST, que negociou a alteração que beneficiou o
movimento”, disse um especialista em habitação da Câmara.
Modus operandi faz crescer oposição ao movimento
A política de atuação do MTST, além das práticas de pressão,
como invasões de prédios e terrenos (públicos ou privados) para usá-los como
ferramenta da militância contra estruturas de governo, intensificada na capital
nos últimos três anos na capital paulista, começam a sofrer forte oposição na
periferia.
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Rosalvo Salgueiro líder do Movimento Terra de Deus Terra de Todos |
“Nós não concordamos com os métodos do MTST”, diz Rosalvo
Salgueiro, dirigente do Movimento Terra de Deus, de São Miguel Paulista, zona
leste da capital. Ligado ao PSDB e com acesso livre ao governador Geraldo
Alckmin (PSDB), Salgueiro é hoje um contraponto ao MTST na disputa que ocorre
nas periferias da capital e região metropolitana por terrenos para construção
de casas pelas regras do MCMV Entidades.
Por esta modalidade, que já tem 848 entidades habilitadas no
Ministério das Cidades, associações de moradores e movimentos sociais
“concorrem” pelo dinheiro com incorporadoras e podem obter recursos para os
próprios empreendimentos, financiados por meio da Caixa Econômica Federal.
“Nós não concordamos com invasão dos terrenos e nem com o
uso dessas áreas como prioridade no MCMV”, declara Salgueiro, um dos
articuladores da criação de uma lista única de áreas para acesso aos recursos
dos programas MCMV e da Casa Paulista, o programa estadual. Essa medida já foi
aprovada em novembro no Conselho Estadual de Habitação e deve começar a ser
aplicada em 2016. Pela regra da fila, apoiada por exemplo pelo secretário
estadual, Rodrigo Garcia, os projetos de habitação no Estado terão de seguir critérios
claros.
Primeiro, estar entre projetos do CDHU que estão migrando
para o MCMV, com prioridade pelo sistema de chamamento. Depois, obedecer a
ordem dos que já estão credenciados na Caixa, que seriam entre 7 mil e 8 mil
unidades, além de projetos que já estão em análise.
Só aí estariam habilitados a receber a contrapartida de R$
20 mil do Estado por unidade por meio do Casa Paulista, alcançando os R$ 96 mil
aplicados na construção por unidade - o governo federal aporta R$ 76 mil. Já o
MTST não quer nem saber de criação de lista. “Se o governo de São Paulo fizer
isso, vai paralisar a construção de habitação”, diz Boulos. “Aí vamos acampar
no Palácio”.
Tensão
Para o dirigente dos Sem Terra de Deus, o MTST “atropela”
outros movimentos de moradia operando em Brasília e “indicando gente para o
setor de habitação da Caixa, que aprova os projetos do MTST na frente dos de
outros”. Salgueiro afirma que Boulos tem acesso direto ao Planalto porque é
ligado ao PT. “Temos hoje dois blocos no movimento popular: um, que se diz
socialista, alinhado com o PT e o governo federal. É nesse que está o Boulos”,
diz. “Nós estamos no outro bloco, o dos socialdemocratas. ”
A tensão entre os movimentos em São Paulo, acirrada
atualmente pelo clima de desgaste dos governistas e reforço da oposição ao PT,
na verdade, não é de agora. “Nós tínhamos um terreno no Embu, o João Paulo 1º,
que era CDHU, destinado para nós”, lembra Salgueiro. “Eles (do MTST) foram lá
ocupar a área que era nossa”, diz. “Peguei o nosso pessoal e tiramos eles no
pau”, arremata o líder dos sem-teto dos tucanos.
No MTST, quando se trata de críticas a Salgueiro, a conversa
é desconversar. “Nós não brigamos com outros movimentos”, diz um dos dirigentes
de uma associação do movimento.
Artigo de Pablo Pereira