quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Perfil: Marianne Spiller (ABAI)

Marianne posa para foto com Eloy Jacintho, coordenador da Tekoa do Território sagrado Retomada em Piraquara  

Sem semente, não tem civilização.” Com essa frase forte, Marianne Spiller defende sua atuação social à frente da ABAI, uma entidade com ações diversificadas para apoiar a agricultura familiar. Recentemente, no começo de outubro, a ONG organizou a décima edição da Festa da Semente e dos Guardiões e Guardiãs da Biodiversidade na cidade de Mandirituba (PR).

O evento é um ponto de encontro de produtores rurais onde podem realizar intercâmbio de sementes crioulas – assim são chamadas as sementes em seu estado natural, sem agrotóxico ou manipulação genética. A troca delas é cada vez mais relevante, pois empresas gigantes, que através de fusões entre si aumentaram o seu poder, como Bayer com a Monsanto, Syngenta fusionada com uma empresa chinesa, Controla e BASF. Elas dominam o mercado de sementes, comercializando matrizes inférteis para manter seus lucros. Quem usa as sementes dessas gigantes não consegue usar parte da produção para garantir a safra seguinte. Sem as sementes crioulas, o produtor fica refém dessas empresas.

Há mais de 50 anos no Brasil, Marianne deixou para trás a Suíça para lutar contra injustiças sociais. Foi no interior do Paraná, ao lado dos camponeses para levar desenvolvimento para o campo, que ela achou seu lar.

Inspiração, pesquisa e trocas

Sobre a Festa, tudo começou em 2012, quando a Comissão Pastoral da Terra (CPT) realizou a Romaria da Terra no Paraná. Depois desse acontecimento, Marianne foi instigada a perpetuar a prática. Para isso, saiu a campo para pesquisar outros eventos do tipo, alguns dentro do estado do Paraná, outros mais distantes, como Sementes da Paixão, na Paraíba. 

Nesses dez anos de celebrações, a Festa de Semente cresceu. É verdade que bem na primeira edição caiu uma chuvarada que resultou em uma visitação menor. No entanto, agora a fama do evento atrai um público mais plural. Com a presença de representantes de povos indígenas e de quilombolas, mais variações de sementes e conhecimentos são trocados.

“A gente respeita o lado sagrado da semente”, diz Marianne. A ABAI tem um cuidado especial com uma semente crioula de milho tupi, distribuindo-a para o Brasil inteiro. Essa variedade de milho, chamado de Avaxi ete ("milho verdadeiro", em guarani), é sagrado para os povos Guarani e tem grãos de um belo colorido. Os indígenas usam esse milho tanto na alimentação quanto em rituais.

Em ritmo de semear

Nestes dez anos passados, as Festas de Semente se multiplicaram e cresceram muito no estado do Paraná, alcançando hoje no total um público de aproximadamente 30.000 pessoas. Além do intercâmbio de sementes, o evento trazia muitas atrações, como a apresentação da banda Filhos da Mãe Terra

O grupo executa músicas autorais que tratam de temas do campo e da agricultura familiar. As apresentações da banda acontecem em outros encontros do tipo, como o Congresso Nacional de Agroecologia, no Rio de Janeiro. “Às vezes, a arte é uma comunicação melhor do que a fala”, argumenta Spiller.

Trabalho para o ano todo

Concluídas as celebrações, antes de preparar a próxima edição, Marianne está com a agenda movimentada. Para registrar seus feitos perante as autoridades, a equipe da ABAI entregou um relatório sobre esta festa para o Ministério Público do Paraná e para vários deputados estaduais paranaenses.

Além das funções diretamente ligadas à festa, como a catalogação de sementes crioulas, há muito a ser feito no dia a dia da ABAI. A entidade mantém um centro socioambiental, que atende a 110 crianças de 4 a 12 anos oferecendo ensino de agroecologia no turno da manhã. De tarde, é a vez dos jovens. Para completar, há ações de suporte para que os adultos superem os males causados pelo alcoolismo e consumo de drogas.

E, até outubro de 2024, Marianne e a ABAI seguirão nessa toada para organizar mais uma edição da Festa de Semente. Para os futuros frequentadores, é aconselhável já reservar um espaço na agenda para participar dessa profunda troca.


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